Um hoquista em Timor – parte 5

1963

PORTO DE DILI E PEQUENOS PORTOS DA PROVÍNCIA

Rotas de navegação efectuadas pelos Serviços Topo-Hidrográficos em redor da Povíncia de Timor Leste

Rotas de navegação efectuadas pelos Serviços da Brigada em redor da Província de Timor Leste.

Para terminar esta minha saga por Timor, irei transcrever a correspondência e o relatório por mim elaborado, relativo ao fecho das actividades que competiam ao Serviços Topo-Hidrográficos, por si só elucidativos dos trabalhos efectuados. Após 50 anos, muitos elementos perderam-se, de tanto os manusear e rever, tais como cartas produzidas, fotografias, cadernetas e anotações que mantive em pastas individuais aquando do meu regresso a Moçambique.

Todavia, alguns elementos ficaram. Assim, aproveitarei o essencial para lhes dar uma forma inteligível, mesmo apesar das lacunas existentes, afim de proporcionar uma imagem de como correram as tarefas, os sucessos e as dificuldades estranhas à nossa vontade, que houve que superar. Tudo isso exclusivamente relacionado com os levantamentos por mim liderados, dos Pequenos Portos da costa norte, Lautém, Laga e Manatuto e, por último, o porto de Béloi na Ilha do Ataúro.

Havia contudo procedimentos a cumprir em termos da burocracia vigente, de modo a ficarem bem definidos, preto no branco, os compromissos de ambas as partes :

CORRESPONDÊNCIA

Exmo. Sr. Encarregado do Governo de Timor

Excelência

FRANCISCO XAVIER FRANCO BÉLICO DE VELASCO, contratado, nos termos do artigo sétimo, parágrafo primeiro, do Decreto número 40.869 de 20 de Novembro de 1956 conjugado com as disposições do artigo 45, parágrafo primeiro, alínea a) do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino e da Portaria 17.535, de 15 de Janeiro de 1960, para prestar serviço como topógrafo da Brigada de Estudos e Construção de Portos desta Província, tendo tomado posse do cargo em 21 de Maio de 1961, posse essa confirmada em 5 de Julho também do mesmo ano, estando prestes a terminar o período contratual que lhe confere direitos de denúncia do contrato que efectuou, expões a V. Exa o seguinte:

Não pretende o signatário renovar por mais um ano o seu contrato que finda em 4 de Julho próximo, por motivos de sua vida particular.

No entanto, consciente de que se denunciar o contrato nesta altura, poderá criar uma situação difícil para os Serviços Topo-Hidrográficos da Brigada, em virtude de ser o único topógrafo existente no seu quadro, aceita o signatário permanecer por mais os dias que forem necessários para finalizar os trabalhos em curso, a cargo dos Serviços Topo-Hidrográficos referidos e que a seguir passa a descriminar:

PORTO DE DILI

1 – Finalização do levantamento topográfico da Costa de Dili, correspondente à zona de Fatu Cama.

2 – Construção à escala 1/2000 das cartas – folhas 3, 4 e 5 – do Plano Geral, em tela opaca e papel vegetal.

3 – Construção à escala 1/5000 das cartas – folhas 1, 2 e 3 – do Plano Hidrográfico, em alumínio e papel vegetal.

PEQUENOS PORTOS

1 – Levantamento topo-hidrográfico dos pequenos portos de Laga, Lautém, Manatuto e Ataúro.

2 – Construção das cartas correspondentes, em alumínio e papel vegetal.

Não entrando em linha de conta com impedimentos estranhos à vontade do signatário, tais como doença ou falta de meios para executar os trabalhos e calculando um período de quarenta dias para os trabalhos de campo que faltam realizar e um período de trinta para os correspondentes de gabinete, prevê o signatário levar a bom termo a tarefa atrás descriminada, ficando desse modo liberto, em fins de Julho, para poder regressar a Moçambique.

Assim, se for de interesse do Estado, tem o signatário a liberdade de sugerir a sua manutenção, nos termos contratuais, até conclusão dos trabalhos atrás descriminados, com a garantia de rescisão imediata, por iniciativa da Administração, de forma a permitir a desobrigação necessária ao seu regresso.

Pede deferimento. Dili, aos 2 de Maio de 1963

Anexo: Quadro do planeamento dos trabalhos a realizar:

Planeamento executado na totalidade, com excepção das datas por razões imprevisíveis.

Planeamento executado na totalidade, com excepção das datas, por razões imprevisíveis.

– E vários foram os impedimentos que evitaram a minha saída em Agosto. A restauração da lancha Lacló demorou mais tempo do que se antecipara e uma minha caída de cama, isto é, de maca, numa tenda de campanha, em Ataúro, que durou mais de uma semana e que será descrita mais adiante. 

Nota N (s/n)                                                           Exmo. Sr. Eng. Chefe da Brigada de Portos

Para conhecimento de V. Exa., tenho a honra de enviar o Relatório das actividades dos Serviços Topo-Hidrográficos, concernente ao período que vai de Janeiro passado ao presente momento, acompanhado de dois processos de arquivo, um referente ao porto de Dili e outro aos Pequenos Portos da Província.

Mais junto os processos individuais dos Pequenos Portos de Béloi, na ilha do Ataúro, de Lautém, Laga, Baucau, Vemasse, Liquiçá e Pante Macassar (Oé-Cusse), na costa Norte e de Loré, Aliambata, Beaço-Vécia, Betano e Suai, na costa Sul.

Dili, aos 12  de Outubro de 1963

O TOPÓGRAFO, CONTRATADO (assinado)

FV/mc                                 Francisco Velasco

                                                                R E L A T Ó R I O

Com o presente relatório propõe-se o signatário encerrar as actividades dos Serviços Topo-hidrográficos desta Brigada, uma vez que os mesmos atingiram o fim para que foram criados no respeitante à elaboração do Plano Hidrográfico, à escala 1/5000 e Plano Geral, à escala 1/2000, do Porto de Dili e Estudos dos Pequenos Portos.

Por força das circunstâncias, em princípios do corrente ano, viu-se o signatário a braços com a responsabilidade de fazer o fecho, digamos assim, de todos os trabalhos executados pela Topo-Hidrografia, desde que esta, em 1960, começou a funcionar.

Nomeado verbalmente por V. Exa., em 15 de Janeiro do corrente ano, após a saída do topógrafo-chefe, para assumir o controlo e orientação dos Serviços Topo-Hidrográficos, meteu o signatário ombros a essa tarefa imprevista, quando menos de cinco meses faltavam para terminar o seu período de contrato, que lhe daria plena liberdade para regressar a Moçambique, uma vez que não era seu desejo permanecer mais um ano na Província.

Consciente no entanto, que o seu regresso numa altura em que a Brigada não dispunha de mais funcionários na especialidade, criaria forçosamente sérias dificuldades na finalização dos trabalhos em curso, acedeu o signatário continuar por mais o tempo que fosse necessário afim de os terminar.

Uma vez em acção, fez o signatário o balanço às realizações existentes, de modo a poder delinear um plano de trabalhos que abarcasse as missões que cumpria aos Serviços Topo-Hidrográficos executar.

A situação dos trabalhos em Janeiro do corrente ano, altura em que o signatário assumiu as novas responsabilidades, era a seguinte:

TRIANGULAÇÃO

a) – Estavam escolhidos e determinados marcos por toda a costa do Porto de Dili, desde o marco 3A (extremo oeste), até ao vértice geodésico da Missão Geográfica de Timor, Fatu Cama (extremo leste). Estes marcos foram triangulados e nivelados pelo topógrafo-chefe e serviram de apoio às poligonais de levantamento topográfico da costa.

b) – Estavam escolhidos e determinados os vértices utilizados nas cartas de sextante. Foram escolhidos e calculados pelo topógrafo-chefe e serviram de apoio ao levantamento do porto.

TOPOGRAFIA

a) – Estava levantada a costa, desde o marco 3A (extremo oeste) até ao marco 4F (Fatu Bandeira), localizado pouco depois do cemitério de Santana. Este trabalho foi executado pelo desenhador Leitão, numa série de poligonais fechadas, posteriormente calculadas, verificadas e compensadas em gabinete.

HIDROGRAFIA

a) – Existia o levantamento da costa, de perfis de 300m de comprimento, azimutados a norte, distanciados entre si de 25 e 50m, desde o marco 4F (Fatu Bandeira) até ao Farol, levantados inicialmente pelo topógrafo-chefe e posteriormente pelo desenhador Leitão, e a continuação do mesmo levantamento, do Farol até ao marco 3A (extremo oeste), efectuado pelo signatário.

b) – Existia o levantamento a sonda sonora, cobrindo todo o porto de Dili, executado pelo topógrafo-chefe e pelo signatário em 1961 e 1962.

PEQUENOS PORTOS

a) – Estavam levantados os pequenos portos de Loré, Aliambata, Vécia-Beaço, Betano e Suai, na costa sul; os portos de Baucau, Vemasse e Liquiçá, na costa norte e o porto de Pante Macassar, no enclave do Oé-Cusse.

DESENHO

a) – Existia uma folha do Plano Geral, em papel continuo (tela), que mostrava uma faixa da costa e da cidade junto ao mar, desde o marco 3H (bairro do Farol), ao marco 4B (um pouco antes da Sota), implantada e desenhada em 1961, pelo desenhador Machado.

b) – Existia outra folha, também do Plano Geral, em papel continuo (tela), mostrando uma faixa da cidade e subúrbios a leste, desde a Sota ao marco 4F (Fatu Bandeira), implantada em 1961 pelo desenhador Machado.

c) – Existia o desenho em papel tela transparente, do Plano Hidrográfico do porto de Dili, à escala 1/5000, totalmente implantado e desenhado pelo signatário.

d) – Existiam, em papel vegetal, as cartas de sextante I, II, II, IV, V, VI, VII, à escala 1/5000, construídas e desenhadas pelo signatário.

e) – Existiam os desenhos a vegetal dos pequenos portos de Loré, Aliambata, Vécia-Beaço, Betano e Suai, na costa sul e Baucau, Vemasse, Liquiçá e Pante Macassar na costa norte.

Em face desta existência e da meta que se pretendia atingir, dividiu o signatário o que faltava realizar em duas frentes que começou imediatamente a atacar:

I – Trabalhos de campo.

a) – Porto de Dili: levantamento topográfica das últimas poligonais da costa de Dili, até Fatu Cama.

b) – Pequenos Portos: Levantamento topo-hidrográfico dos portos de Lautém, Laga e Manatuto, na costa norte e Béloi, na ilha de Ataúro.

II – Trabalhos de gabinete.

a) – Porto de Dili:

1. Cálculos: – Recuperação dos trabalhos existentes, dispostos aqui e além, nas mais variadas folhas de papel, passando-as a limpo em impressos desenhados para o fim em vista.

2. Plano Geral: – ((Este plano à escala 1/2000 cujo critério de construção não estava definido, foi pelo signatário esquematizado em 5 folhas abrangendo agora todo o porto de Dili, desde o marco 3A (extremo oeste) até ao vértice da M.G.T. (extremo leste)). Completagem dessas folhas – houve que as calcular e construir as respectivas cartas de sextante, com o levantamento hidrográfico além da faixa de 300m junto à costa.

3. Plano Hidrográfico: – Reconstrução do mesmo sobre 3 folhas de alumínio, agora abrangendo todo o porto de Dili, extremo oeste a extremo leste.

4. Desenhos:

1. – Construção das 5 folhas do Plano Geral, à escala 1/2000, em papel vegetal, matrizes definitivas.

2. – Construção das 3 folhas do Plano Hidrográfico, à escala 1/5000, em papel vegetal, cópia das matrizes definitivas em alumínio.

3. – Construção de cartas, em papel vegetal, dos pequenos portos de Béloi, na ilha de Ataúro, de Lautém, Laga, Baucau, Vemasse e Liquiçá, na costa norte, e de Loré, Aliambata, Vécia-Beaço, Betano e Suai,na costa sul, numa linha uniforme, estudada pelo signatário.

Nesta frente, houve que se rever a orientação já estabelecida, definindo-se um critério único na orientação dos trabalhos. A sua compilação e organização, como é normal em serviços técnicos desta natureza, não tinham merecido aquela atenção que seria de se desejar. modificaram-se, portanto, directrizes anteriores que levavam a trabalhos incompletos e, nalguns casos, a trabalhos tecnicamente inferiores.

No sector de “Desenhos”, partiu o signatário quase do zero absoluto. Todas as realizações existentes, cada uma per si tiveram de merecer nova consideração e tratamento.

Foram estes, por alto, os trabalhos principais que o signatário fez executar à testa dos serviços Topo-Hidrográficos e julga ter cumprido com o fim em vista: – Concentração em processos de arquivo, dentro de uma certa ordem e uniformidade, de todas as realizações dos serviços Topo-Hidrográficos referentes às suas missões capitais, desde 1960 ao presente momento.

Para o sucesso destes trabalhos, na sua quase totalidade executado no curto espaço de tempo de dois meses e meio, não pode o signatário deixar de fazer especial referência ao espírito diligente e trabalhador do auxiliar de topógrafo Vitor Godinho e, no aspecto geral, ao entusiasmo e boa vontade postos por todos os componentes dos serviços Topo-Hidrográficos, que muito contribuiu para que o signatário levasse a bom termo a tarefa ora realizada.

Assim, tem o signatário a honra de enviar a V. Exa, dois processos de arquivo, um referente ao Porto de Dili e outro aos Pequenos Portos da Província, cujas matérias em arquivo passo a discriminar:

PROCESSO I – PORTO DE DILI

A) – TOPOGRAFIA

1 – Elementos fornecidos pela Missão Geográfica de Timor:  – a) Coordenadas definitivas e cotas de triangulação de Dili: – b) Esquema da triangulação de Dili – M.G.T.

 2 – Triangulação dos vértices de apoio às poligonais de levantamento topográfico da costa de Dili: – a) Elementos de cálculo.

3 – Poligonais de levantamento topográfico da costa de Dili: – a) Elementos de cálculo.

B) – HIDROGRAFIA

1 – Triangulação dos vértices de apoio ao levantamento hidrográfico – Pontos de sextante: – a) Elementos de cálculo. – b) Esquema de localização.

2 – Cartas de sextante: – a) Elementos de cálculo – b) – Cartas I a VIII à escala 1/5000 – c) – Carta de sextante do porto interior à escala 1/2000.

3 – Levantamento hidrográfico a prumo de sonda: – Faixa de 300m da costa: – a) Croquis de localização de perfis.

4 – Levantamento hidrográfico a sonda sonora: – a) Elementos de cálculo.

C) – CARTAS E MAPAS

1 – Mapa da Ilha de Timor: – a) Localização do Porto de Dili

2 – Plano do Porto e da cidade de Dili – C.C. (1870)

3 – Plano hidrográfico do Porto de Dili – M.G.T. (1945), escala 1/2000

4 – Plano hidrográfico do Porto de Dili – B.P.T. (1961): – a) Esquema de folhas. – b) Folhas 1, 2 e 3, à escala 1/5000.

5 – Plano Geral do Porto de Dili: – a) Esquema de folhas. – b) Folhas 1, 2, 3, 4 e 5, à escala 1/2000.

PROCESSO II – PEQUENOS PORTOS

1 – Mapa da Ilha de Timor: – a) Localização dos pequenos portos em função da Rede de Estradas e Divisão Administrativa da Província.

2 – Portos da Ilha de Ataúro: – a) Béloi

3 – Portos da costa norte: – a) Lautém, – b) Laga, – c) Baucau, d) Vemasse, e) Liquiçá e f) Pante Macassar.

4 – Portos da costa sul: – a) Loré, – b) Aliambata, – c) Vécia-Beaço, – d) Betano, – e) Suai.

Dili, aos 12 de Outubro de 1963

O TOPÓGRAFO, CONTRATADO (assinado)

FV/mc                                 Francisco Velasco

Para dar uma ideia dos levantamentos efectuados, reproduzo as memórias descritivas de cada um dos portos da costa norte e uma reprodução fotográfica da carta de Béloi, na ilha de Ataúro, bem como uns incidentes memoráveis, num e noutro porto. Outras ilustrações poderão ser incluídas mais tarde, assim que preparadas.

PORTO DE LAUTÉM

Descrição

O Porto de Lautém fica situado na costa norte de Timor. As suas coordenadas geográficas aproximadas são as seguintes: – Longitude: 126 graus 53′; – Latitude: 8 graus 12′.

Em frente da pequena baía, que é o porto de Lautém, situa-se a Alfândega, um edifício em alvenaria onde actualmente se encontra instalado o Comando da 3ª Companhia de Caçadores que ocupa toda a zona portuária com as suas instalações militares. À excepção de algumas casas de palapa timorenses, localizadas por detrás do aquartelamento, não existem outras moradias de civis.

A sudoeste do edifício da Alfândega erguem-se junto da estrada três casas de alvenaria cobertas a colmo onde reside pessoal da Companhia de Caçadores. Mais adiante junto da praia e logo a seguir a uma ribeira pequena que desagua no porto, aparecem as ruínas de uma muralha, de uma torre alta e colunas que são os vestígios da antiga Administração de Lautém. A nordeste da Alfândega, sobranceiros ao mar situam-se dois abrigos construídos pelos Japoneses, ainda em bom estado.

A estrada Baucau-Con passa entre o edifício da Alfândega e a praia, bifurcando mais a nordeste para o Môro – Nova Lautém – distante uns 4 quilómetros, onde está instalado o Posto Administrativo.

A cerca de 80 metros, também a nordeste da Alfândega, ergue-se um Farolim de pedra construído nos mesmos moldes dos que existem noutros pequenos portos de Timor. Segundo informações colhidas, este Farolim e um muro de pedra, com degraus de acesso ao topo, situado mais atrás, constituíam o enfiamento que determinava o ancoradouro. Constatou-se o azimute magnético desse enfiamento que se verificou ser 350 graus 5′.

O ancoradouro fica entre duas barreiras de coral, no meio das quais se desenvolve uma faixa de praia constituída de areia e absolutamente isenta de pedras ou corais. A sudoeste do porto, a uma distância de 900 metros, desagua a ribeira de Malai-Lada que tem provocado um assoreamento bastante sensível junto da foz. Este assoreamento alargou-se, influenciando quase metade da pequena baia de Lautém o que facilmente se verifica, analisando-se as batimétricas determinadas.

Informações pormenorizadas sobre ventos e estado do mar não se conseguiram obter, mas o que se ouvia deste e daquele, regista-se que no período correspondente a Janeiro, Fevereiro e Março, o mau tempo assola o porto tornando o mar agitado e as ondas alterosas. É neste periodo que os ventos sopram de oeste.

Levantamento do Porto

Levantou-se cerca de 1800 metros da costa e zonas adjacentes e uma área e mais ou menos 700 por 1600 metros que cobre o ancoradouro. Os pontos conspícuos são o edifício da Alfândega, a torre da antiga Administração de Lautém e o Farolim de pedra.

Não foi feita a ligação à rede geodésica de Timor dada a inexistência de vértices nas proximidades sendo que as coordenadas utilizadas foram arbitradas e os azimutes, magnéticos.

As cotas foram referidas a um plano que passa 2,03 metros abaixo do nível médio das águas e 6,785 metros abaixo de uma cápsula metálica que se chumbou no primeiro degrau da escada leste de acesso à varanda do edifício da Alfândega. O nível médio das águas foi determinado a partir de um gráfico de curvas de marés verificadas num período de ininterrupto de 48 horas que se obteve por meio de leituras de alturas das águas efectuadas de 10 em 10 minutos, numa escala levantada sobre o coral e mantida na vertical por meio de fios de arame.

Referências fixas do levantamento são os marcos de cimento com a inscrição “BP“. O Marco I colocou-se junta à praia numa crista inacessível ao mar e o Marco II fundiu-se num coral saliente mesmo defronte dos abrigos de betão construídos pelos Japoneses, ambos a nordeste do porto. No outro sentido, colocou-se o Marco III também num maciço de coral saliente e, mais adiante, o Marco IV, a cerca de 100 metros da foz da ribeira de Malai-Lada, numa crista inacessível ao mar.

Construiu-se uma quadrícula adequada ao porto de modo a que as sondagens abarcassem uma maior área. As sondagens foram feitas por perfis, em número de 27, distanciados entre si 50 metros, que ficaram orientados para o azimute 152 grados 10′, sensivelmente normais à costa. Levantaram-se ainda 7 perfis a prumo de sonda, também com a mesma orientação, cujas origens caíram sobre o alinhamento Estação C – Marco II, com um comprimento de 150 metros. A finalidade deste levantamento a prumo de sonda de 10 em 10 metros, foi determinar-se com mais rigor, as profundidades de um fundão que aparece bruscamente junto dos corais, fundão esse assinalado pelo enfiamento “Farolim-Muro“. O perfil número 1 está a 45 metros da Estação C.

Este levantamento não surtiu o efeito desejado visto que o cabo de aço utilizado como perfil, por velho, ferrugento e cheio de nós, se ter partido diversas vezes, obrigando a aproveitar-se somente 150 metros do seu comprimento o que é metade do pretendido. Durante o levantamento com a sonda sonora, esta não funcionou bem nos primeiros perfis, deixando de registar a partir dos 40 metros de profundidade. Houve que retirar o vibrador e agitá-lo para que o aparelho passasse a funcionar melhor se bem que ainda longe do ideal.

A carta do Porto de Lautém foi construída sobre uma folha de alumínio, à escala 1/2000, que servirá de matriz definitiva e todos os elementos que serviram de base à sua construção, foram devidamente registados e arquivados.

Distribuição dos trabalhos

I – Na orientação dos trabalhos esteve o signatário que efectuou o levantamento topográfico da costa, o cálculo da poligonal levantada, para determinação de coordenadas e cotas, a determinação do nível médio das águas e respectiva fixação em terra e o levantamento hidrográfico da zona do porto. Fez também o cálculo para implantação dos perfis e sua implantação no terreno.

Nestes trabalhos, empregou os seguintes aparelhos: No levantamento topográfico, um teodolito WILD T1-A; no nivelamento um nível ZEISS Ni2 e no levantamento hidrográfico uma sonda sonora RAYTHEON-DE 119-A. Desenhou também a carta do porto sobre a folha de alumínio, à escala 1/2000.

II – Coadjuvando com o signatário, esteve o auxiliar de Topógrafo, Vitor Godinho, que tratou dos registos dos elementos colhidos no campo. Efectuou também os cálculos de cotas das cadernetas do levantamento topográfico e as reduções de sonda do levantamento hidrográfico. Levantou ainda os 7 perfis, a prumo de sonda e fez a implantação do levantamento na matriz de alumínio. Na implantação das profundidades obtidas por meio da sonda sonora, utilizou um “station-pointer”

III – No controlo do material e instalação do acampamento e fundição dos marcos, esteve o Porta-mira Filipe que foi também um observador de sextante durante o levantamento hidrográfico, tendo colaborado em trabalhos de gabinete, sempre que necessário.

Registo diário do trabalho

Dia 10/5/63 – Sexta-feira: 1) Saída de Dili na “Modestinha” pelas 22h00.

dia 11/5/63 – Sábado:1) Chegada a Baucau às 06h30. Fui à Administração solicitar autorização para guardar um bidão de gasolina de 200 litros que ficou no edifício da Alfândega. – 2) Largámos de Baucau com destino a Lautém pelas 12h30. – 3) Chegada a Lautém pelas 16h00. – 4) Montagem do acampamento.

Dia 12/5/63 – Domingo: – 1) Continuação da montagem do acampamento durante a manhã. – 2) Reconhecia a zona trabalho, também de manhã. – 3) À noite foi colocada a escala de marés e iniciaram-se as leituras por volta das 20h00.

Dia 13/5/63 – Segunda-feira: 1) Localização dos locais para colocação dos marcos. – 2) Colocação de marcos (quatro). – 3) Nivelamento do taco metálico no piso da Alfândega.    – 4) Nivelamento do Marco II. – 5) Cálculo da caderneta de nivelamentos.

Dia 14/5/63 – Terça-feira:  – 1) De manhã, levantamento topográfico da costa de Lautém, desde o Marco I ao Marco II. – 2) À tarde, levantamento a partir do Marco II até à estação “C”. – 3) Cálculo das cadernetas de levantamento.

15/5/63 – Quarta-feira: -1) De manhã, levantamento topográfico das estações “D” e “ID” e implantação da “E”. – 2) Determinação das diferenças horárias entre as previsões de marés da Tabela do Almirantado Britânico e as marés verificadas em Lautém. – 3) Fez-se a determinação do nível médio e cálculo da caderneta do levantamento. – 4) À tarde, fez-se o levantamento topográfico da estação “F” e cálculo da caderneta.

Dia 16/5/63 – Quinta-feira: – 1) Levantamento topográfico da estação “G” e do Marco III, efectuado na parte da manhã. – 2) À tarde, fez-se o levantamento das estações “H” e “I” e do Marco IV. – 3) Cálculo da caderneta.

Dia 17/5/63 – Sexta-feira: – 1) Cálculo da caderneta de levantamento. – 2) Cálculo da poligonal do “Marco I até ao Marco IV“. Cálculo para determinação das coordenadas e cotas da poligonal. – 3) Visita ao Con, pelas 16h00, acompanhados pelo Eng. Chefe da Brigada, Eduardo Barbosa. – 4) À noite, continuação dos cálculos da poligonal.

Dia 18/5/63 – Sábado: – 1) Cálculos para implantação de perfis. – 2) Mau tempo impediu qualquer trabalho. – 3) Iniciei o traçado de uma quadrícula mais adequada ao porto de Lautém. – 4) Experiência com a sonda sonora que registou as 4 fases.

Dia 19/5/63 – Domingo: -1) Em virtude do mau tempo, iniciei a implantação dos perfis pelas 12h30, dado o vento, só marquei perfis desde o MARCO I à estação “C“. -2) Iniciei uma nova quadrícula a tinta da china que ficou razoável, tendo o Vitor Godinho iniciado a implantação de levantamento. – 3) Pelas 16h30 dei começo ao levantamento hidrográfico que foi interrompido devido à ondulação que se levantou.

Dia 20/5/63 – Segunda-feira: – 1) Implantação de perfis desde a estação “C” até 5 perfis depois do Marco III. – 2) Não se fez mais nada devido ao mau tempo e passou-se ao trabalho de gabinete.

Dia 21/5/83 – Terça-feira: – 1) No alinhamento da estação “C” ao Marco II, marquei 7 perfis distanciados entre si 25 metros, ficando o primeiro a 45 metros da estação “C“. – 2) Levantaram-se os perfis a prumo de sonda e, à tarde, fez-se o levantamento das zonas de corais junto as Marcos II e III.

Dia 22/5/63 – Quarta-feira: – 1) De manhã, continuação do levantamento hidrográfico que terminou depois de levantados 17 perfis que somados aos 10 já realizados, abarcam a zona do porto. – 2) À tarde, trabalho de gabinete. Redução de sondas e desenho da carta.

Dia 23/5/63 – Quinta-feita: – 1) Desenho da carta.

Dia 24/5/63 – Sexta-feira: – 1) Desenho da carta e determinação do rumo magnético do Farolim: (350 graus 5′).

Dia 25/5/63 – Sábado: – 1) Trabalho na carta, levantamento do acampamento e preparativos para a largada. – 2) Ida ao Chefe de Posto para averbamento na guia de marcha. – 3) Às 16h30 largámos para Laga onde chegámos pelas 19h30.

Lautém, aos 25 de Maio de 1963

O TOPÓGRAFO, CONTRATADO (assinado)

FV/                                      Francisco Velasco

 

– Segue-se parte 6 e 7 – Pequenos Portos: Laga, Manatuto e Béloi (Ilha de Ataúro)

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2 Responses to Um hoquista em Timor – parte 5

  1. victor godinho says:

    Gostei de ler o que escreves-tes. Mais uma vez um abraco.

  2. Velasco says:

    Caro Victor

    Estou agora a escrever o texto da última parte de Timor. É complementado pela última carta do Porto de Bé-loi por onde andamos e que sobreviveu nos meus arquivos. Quando publicar aviso-te e gostaria então outro comentário teu neste site. A minha descrição é baseada nas minhas memórias e alguns documentos mas acho que te recordarás. Abraço amigo.

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