Mário Wilson – o Corina – por Daniel Muralha

Daniel Muralha

De visita a Oeiras, haverá cerca de um ano, vi passar por mim na rua Mário Wilson e Toni. Iam “de rota batida” não deu para os cumprimentar. Abrandei a passada, olhei para trás e pensei: “Olha, o Toni!” Já não o via em pessoa desde 1970.

O Estádio da Machava, em Lourenço Marques (hoje Maputo), a capital de Moçambique, encontrava-se autenticamente em festa, repleto (“à pinha”), com moldura humana fervilhando de entusiasmo, num domingo à tarde também de Agôsto. Dava-se, naquele ano de 1970, o encontro Benfica-Vitória de Setúbal. Ambas as equipas encontravam-se em tournée, entre épocas. O Vitória era então treinado pelo ”Zé do Boné”, de sua graça José Maria Pedroto.

Eusébio, uma legenda

Os dois “onze” entregaram-se  à tarefa de ganhar – chegado o apito final do árbitro – que acabou por bafejar o das “águias”, o qual integrava, entre muitos outros, Eusébio (“menino d’oiro” para todos os que fazíam a enchente do Machava ) e Vítor Baptista.  Eu tinha ali acorrido, na qualidade de locutor-produtor de uma Rádio estrangeira, a fim de reunir sound bytes para programa posterior. Do Benfica tive o ensejo de registar em fita magnética impressões do Humberto Coelho e do Toni.

Vira assim Toni em pessoa pela derradeira vez, como dizia, nessa tarde quase primaveril no Hemisfério Sul. Com Mário Wilson (e quem não conhece este nome do futebol português?) nunca tivera esse mesmo privilégio de o entrevistar.

Dias mais tarde, para voltar à minha visita do ano passado a Lisboa, revi o “Velho Capitão” Mário Wilson. Aí sim, parei, cumprimentei-o e ele fez-me a amizade de um breve cavaquear.

Este ano, há poucas semanas, ao entrar numa Livraria-Papelaria, também em Oeiras, deparei-me com um livro ali à venda intitulado: “Mário Wilson – o velho capitão”, da autoria de Carlos Rias. Era coincidência demasiada!

Uma obra magistral

Comprei o livro, li as suas 300 páginas relembrando épocas passadas do futebol português e disse para com os meus botões: não é tarde, nem é cedo, é desta que tenho de convidar o “velho capitão” a participar no programa do Fernando Ferreira!

Fernando Ferreira, medalha de ouro

Fernando Ferreira é um velho amigo que deve ser só o radialista ainda em actividade mais antigo de Portugal. Um homem que faz Rádio (com lêtra maiúscula) há 62 anos! Com quem tive o ensejo e prazer de trabalhar em Lourenço Marques nos princípios dos anos ’70. Radialista que produz e apresenta há vinte e quatro (24) anos o programa “Abraço de Domingo”, todos os domingos ao vivo, das 9 às 13 horas, na RDPI (a Rádio Difusão Portuguesa Internacional).

A ser entrevistado…

Programa esse que contara já com a grata presença de Francisco Velasco, no espaço reservado à “Entrevista da Semana”, e que contara também (durante uma outra visita minha a Lisboa) com a presença de outro lourenço-marquino de renome: Carlos Guilherme.

Carlos Guilherme nada tem a ver com o desporto – ainda que nos seus tempos de junior tivesse jogado futebol no SLB, o Sport Lisboa e Beira de Moçambique, a extremo-esquerdo. Como benfiquista que é, o seu “ídolo”era António Simões, claro. O homem da ala esquerda do SLB (neste caso, o Sport Lisboa e Benfica) dos anos ‘60. Carlos Guilherme é tenor consagrado do Teatro S. Carlos, que vai a caminho da sua participação em oitenta (80) Óperas – uma voz também conhecidíssima da música mais ligeira. Com ele houve a coincidência de nos termos conhecido no Liceu, já lá vão também uns anitos.

Fernando Ferreira, Daniel Muralha e Francisco Velasco

Volvemos, então, as nossas atenções a Mário Wilson. Ao falar com Fernando Ferreira sobre a possibilidade de convidar o “velho capitão” ao seu programa disse-me ele: “O Corina? Bem que eu gostaria de trocar impressões com ele. Lembro-me da garagem do pai dele no Alto Maé, assim como do seu primo, o Pitorro, nos meus tempos de Liceu. Nunca mais o vi!” (Bom, já não se víam sem dúvida há muito mais tempo do que eu não via Toni!) Havia que tentar.

Para resumir os passos seguintes basta adiantar que ao convidar Mário Wilson a uma presença no mencionado programa radiofónico, quando lhe disse que o Fernando Ferreira bem gostaria de contar com a presença do “Corina” no seu programa, este respondeu: “Conhece-me como Corina? Esse é dos meus…

E assim  foi. No último domingo de Julho de 2012 “Corina”deu-me boleia até ao recinto da RDP-RTP, lá para os lados do Aeroporto de Lisboa, para aos microfones do Estúdio 24 da RDPI deliciar os ouvintes do “Abraço de Domingo”. Certamente “enchendo as medidas” não só dos benfiquistas na Diáspora da Língua Portuguesa, como de todos os que apreciam a prática futebolística. Na qual o nome de Mário Wilson pertence ao mais elevado escalão, quer a partir dos seus tempos de jovem praticante amador, quer  como jogador e mais tarde treinador, a nível profissional. Meio século, , dedicado ao futebol português. O mencionado livro retrata bem esse longo percurso.

Estou incumbido da entrega de uma cópia dessa entrevista a Mário Wilson. O que farei antes de partir de Lisboa. Após a mencionada entrevista, quero adiantar, agradeci-lhe a sua disponibilidade por saber que a presença de Mário Wilson é sempre solicitada para muitas ocasiões a que os seus vetustos 82 anos de idade não permitem já poder corresponder… até como certamente gostaria.

Não resisti, contudo, a pedir-lhe autógrafos para gente conhecida. Para o meu sobrinho que vive em Macau. Para um primo que é benfiquista ferrenho, para o Carlos Guilherme (que muito o apreciou e me disse: “Diz-lhe que quem canta o Hino do Benfica sou eu… e que gostei imenso de ter trabalhado numa Ópera em que o encenador era um dos seus filhos, o João Pedro!).

Igualmente pedi um autógrafo a Mário Wilson para o Francisco  Velasco. De quem me lembrei, não só por ter ele também participado numa já referida edição do “Abraço de Domingo”, como ainda por ter pertencido, na modalidade do Hóquei em Patins, a contemporânea “geração d’oiro” daquela a que Mário Wilson pertencera no futebol, no seio do desporto moçambicano e português. Quando mencionei o nome do Francisco Velasco, Mário Wilson interpelou: “O Velasco? É pá, ele era o meu ídolo do Hóquei em Patins!

Uns dias depois Wilson telefonou-me dizendo: “Está tudo pronto!” Lá fui eu buscar cópias do livro “Mário Wilson – o velho capitão” com dedicatórias lavradas pela mão do próprio. A cópia do livro para Francisco Velasco tem como dedicatória as seguintes palavras:

Dedicatória do eterno Corina, que aceito com orgulho.

“Amigo Velasco,

Tal qual Matateu e Eusébio tu és, por excelência, um dos meus “ídolos” do Desporto Mundial! Kanimambo!

Mário Wilson

(Velho Capitão)              2.012”

Como vêem e arrematando à guisa de despedida, os melhores em tudo, neste caso no domínio do Desporto (também com lêtra maiúscula): conhecem-se e… reconhecem-se!

Efusivas saudações,

Daniel Muralha – (Lisboa, Julho-Agôsto de 2012)

Não vou adiantar nada a este extraordinário texto do meu querido amigo e dedicado profissional da rádio, Daniel, a não ser agradecer-lhe o valioso contributo que deu para a história do desporto Moçambicano de antanho. Seguir-se-à outra peça por ele também elaborada acerca dos Homens da Rádio, que revela bem o espírito dinâmico que animava estes essenciais agentes do Desporto.  

Quanto ao Corina, também não direi muito mais pois não é preciso, está tudo no Livro que é uma deslumbrante Saga de uma família que todos nós nos habituamos a respeitar. Não é uma obra qualquer, é um documento histórico, social e desportivo que faria um filme de sucesso. Ainda não acabei de o ler, fascinado pelos seus primeiros capítulos.

Passei inúmeras vezes pela residência dos Wilson, a caminho do Liceu e não me passava despercebida a estatura moral desta família. Com a malta do SNECI fomos lá jogar ao Harmonia e só não repetimos a proeza porque, como despeitados futebolistas, não nos agradava encaixar cabazadas.

Ao Corina, envio-lhe um sincero abraço de respeito. Chico.  

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