Época 1984/85 – Sporting Clube de Tomar – parte 2

De pé, da esq.- Álvaro da Graça Ventura, Prof. Costa Marques, Carlos Alberto H. Pereira da Silva, Carlos Manuel Ribeiro da Cruz, Mário Rui Simões Lopes, João Eduardo Gomes, Renato Manuel da M. M. Rodrigues - Agachados: Vasco Parreiral Simões Vaz, Manuel Luís de Oliveira Bravo e Araujo e Vítor Capitolino.

Foi com surpresa que, por volta do dia 4 de Janeiro de 1985, a anteceder a jornada do Campeonato Nacional, fui contactado pelo novo Presidente do Sporting Clube de Tomar, Dr. Libério Grilo, acerca da possibilidade de voltar a tomar conta da equipa que estava a necessitar de um estímulo para enfrentar o resto da prova. Em conversas havidas com ele, elaborei sobre o que se tinha passado na época anterior e a forma esquisita como fora tratado, como se nunca tivesse passado por lá.

Fui esclarecido que com ele na Presidência, a situação era agora diferente  e que havia um projecto a elaborar, com algum futuro, havendo um consenso por parte de todos os dirigentes e atletas pelo meu regresso ao cargo de Treinador. Para justificar a nova atmosfera, demonstrou-me inequivocamente que o meu nome tinha sido escolhido por uma forma “altamente” democrática, o que achei interessante. Posto isso, não tive dúvidas em aceitar e concordei em encontrar-me com os restantes dirigentes.

Envelope contendo os votos dos dirigentes

Envelope contendo os votos dos atletas

A reunião teve lugar na minha casa em Cascais, com a presença de vários elementos da Direcção do Clube e, após várias condições que foram acordadas, concordei em assumir novamente a função de Treinador, até porque parecia haver um novo entusiasmo mais condicente com a oportunidade de poder trabalhar quase um ano inteiro, ao contrário do que se passara na época anterior. Para mais, nada me poderia deixar-me mais embebido do que as “urnas” revelarem que dos 23 votos válidos, 22 indicaram o meu nome!

Assim, no dia 5 de Janeiro, segui para Tomar com o Presidente e, durante a viagem de comboio, travamos uma longa conversa durante a qual, dum certo modo, procurámos dar-nos a conhecer.  A empatia foi imediata até porque a visão desportiva de ambos era coincidente. Da cidade Nabantina, acompanhei a equipa ao Norte, para o jogo contra a Juventude de Viana e, no regresso, realizou-se uma reunião na Sede do Clube, quando tudo foi confirmado.

Acho curial inserir aqui um episódio referido na 1ª parte, relativo à forte ventania que soprara pelos lados do rio Nabão, em princípios de Janeiro de 1985 e do qual só tive conhecimento em Junho do mesmo ano.

Em Tomar tinha havido pânico numa árvore da cidade, causando níveis de ansiedade elevados e ruídos que ecoaram uns atrás de outros. As folhas desprenderam-se dos ramos e flutuaram até poisar no chão e entre elas, uma em particular, uma autêntica minuta sumarizada do modo como um do grupo foi enxotado para outra árvore.

Do galho 1: – é necessário mudar!

Do galho 2: – tem errado… não deu provas… remediar já!

Do galho 3: – falta de táctica!

Do galho 4: – mentalização nula, tacticamente fraco!

Do galho 5: – a equipa não está a ser devidamente aproveitada!

Do galho 6: – demora a pensar, mudança rápida!

Do galho 7: – nada se tem visto!

Do galho 8: – sem imaginação e sem reflexos!

Do galho 9: – abstenho-me!

Do galho 10, acima: – bom homem apenas…

Do galho 11, mais acima: mudança rápida!

Assim foi, a mudança verificou-se, saltou um e subi eu para o ramo vago. Mas o problema é que se tentam empurrar-me, mordo e faço uma chinfrineira tal que o banzé espalha-se pela floresta, acordando os seus habitantes distraídos. Esse tem sido o meu triste “karma”… mas consigo viver com ele, felizmente, apesar de me sentir como o doido por detrás das grades que acha que os lá de fora é que são malucos!

O novo organograma do Sporting Clube de Tomar, extracto de timbrado, era o seguinte:

Corpos Gerentes:

Assembleia Geral:Presidente: “Major” José Rocha Goulart; – Vice-Presidente: José Júlio Alves Cordeiro; – 1º Secretário: Abílio Lopes Nunes; – 2º Secretário: Rui Lopes Nunes.

Direcção:Presidente: Libério Grilo; – Presidente-Adjunto: João Godinho; – Vice-Presidente da Act. Desportiva: José Alberto Duarte Caetano; …; …;  Secretário-Geral: Guilherme Lopes Nunes; 1º Secretário: Rui de Castro Granja; – 2º Secretário: Luís António Pinho da Silva; – Director Tesoureiro: Fernando Américo Rodrigues de Oliveira; – Director do Departamento de Hóquei em Patins: João Filipe Perfeito; …; …; – Director do Gabinete Jurídico: Carlos Alberto Adão de Sá Correia; Director do Gabinete Médico: António Manuel de Freitas Bastos.

– Conselho Fiscal e Disciplinar:Presidente: José Torres Pereira Redol; – Relator: Arménio Seco Breia.

– Hóquei em Patins:

Coordenador: – João Filipe Perfeito

Seccionistas: – Daniel Silva Vieira; – José Maria Barbosa; – Manuel da Costa; – Lúcio Quádrio; – Sérgio Dantas; – António Monteiro e Joaquim António Mota

Adicionado por mim:

– Grupo Técnico:

Treinador: – Álvaro Jardim, da à jornada, despedido em 3 de Janeiro de 1985

Treinador: Francisco Velasco, em funções desde a jornada, em 6 de Janeiro de 1985 e “despedido?” à 24ª jornada, em 29 de Abril de 1985

Preparador Físico: Prof. Costa Marques

Enfermeiro Massagista: Álvaro da Graça Ventura

Mecânico/Roupeiro: Fernando Silva

– Grupo Atletas:

– Carlos Alberto Henriques Pereira da Silva, de Tomar

– Carlos Manuel Ribeiro da Cruz, de Cascais

Mário Rui Simões Lopes, de Souselas, Coimbra

– João Eduardo Gomes, de Sesimbra

Renato Manuel da Mota Machado Rodrigues

Vasco Parreiral Simões Vaz,

– Manuel Luís de Oliveira Bravo (Gr)

Araújo (Gr)

– Vitor Capitolino

Ao ter conhecimento do plantel de jogadores, fiquei surpreendido pela mudança que se verificara e, em especial, por nele não estar incluído o Honório, um excelente jogador, alma gémea do Capitolino, com quem se entrosava de olhos fechados, formando um ataque de respeito. A mesma pecha de sempre, todos os anos, uma nova equipa…!

Enfim, de qualquer modo, os quatro novos atletas, o Renato, o Gomes, o Mário Rui e o Cruz, trouxeram uma mais-valia digna de se registar, os dois primeiros pela sua juventude e os dois últimos pelas suas características distintas, o Mário Rui, a quem eu tratava por “HULK”, dada a sua força e tenacidade sempre evidenciadas em campo e o Cruz, um esquerdino muito rápido e criativo nas suas hábeis fintas. Os demais já os conhecia, o Pereira da Silva disponível para colaborar, os guarda-redes Bravo e Araújo muito empenhados, o Capitolino com a sua imprevisibilidade goleadora e, a completar todo o grupo, o Vasco Vaz com a sua serenidade e eficácia.

Foi fácil trabalhar com estes atletas e, se me abstrair da equipa do Ferroviário de que fiz parte como jogador/treinador, em Moçambique, estes atletas, incluindo os da época passada, foram aqueles que mais prazer me deram em liderar. Tenho de realçar este facto, não só pelo sentido desportivo dos mesmos, como também pelo nível de amizade, franca camaradagem e respeito mútuo, em que o relacionamento humano foi excepcional e deveras marcante.

De o "Despertar" de 25 de Janeiro 1985

Foi uma honra e um privilégio tê-los conhecido e actuado com eles e quando os deixei, à 24ª jornada, a seis do fim do Campeonato, a equipa estava posicionada, se não me engano, na 4ª ou 5ª posição, ouvindo-se comentários da parte de alguns dirigentes, a reflectirem a sua preocupação com os custos de uma potencial participação nas Provas Europeias. Até parecia que a ideia era competir para não cair de divisão e… procurar evitar entrar nessas provas!

Não me alargarei sobre as jornadas do Campeonato que decorreram sem o menor incidente entre os agentes desportivos do Clube envolvidos nele. Relatarei, todavia, duas historietas que buscam apimentar estas minhas enfadonhas narrativas:

1. A certa altura do Campeonato, o Capitolino bloqueou e os golos não apareciam, o que considerei passageiro. Por mero acaso, ao folhear os jornais da terra dou com uma publicidade de uma empresa Ortopedista, (registe-se que escrevo de memória), que oferecia um emblema ou um setique de ouro ao melhor marcador do Nacional.

Melhores goleadores

O Capitolino terminara a época anterior com essa marca mas sucede que num dos jogos fora de casa, o mesmo dirigente que ambicionava empates noutras saídas, perseguia agora o Capitolino, lembrando-lhe que o Pedro Mendes, do Paço d’Arcos, estava um golo à sua frente, na lista dos melhores marcadores. Acho que foi esse dirigente quem ofereceu o prémio dourado.

Não admira que o Capitolino tivesse bloqueado. O que fazia sem pensar e de acordo com o seu instinto, passou a bailar-lhe na mente, coisa que nunca dá bons resultados. Se não sonhei, (aqui só o próprio jogador poderia corroborar), acabei por ter uma conversa com ele, onde lhe sugeri que não pensasse no assunto e continuasse a agir com naturalidade. Há algumas pessoas que durante anos comandam os destinos do desporto e que não fazem a mínima ideia dos problemas que causam só por abrir a boca. Felizmente que a situação foi ultrapassada e o Capitolino subiu ao topo dos goleadores. Insólito foi também o facto de ter sido o melhor marcador do Campeonato, durante 2 épocas seguidas e não ter sido integrado de modo definitivo na nossa Selecção Nacional, pois bem o merecia dada a sua idade e capacidade.

2. Há outros abstuntos que carregam “obsessões” que realmente espantam qualquer um. Um dos nossos acompanhantes, extravasava por todos os lados o seu ódio aos árbitros. Não falava de outra coisa, era ouvi-lo, este árbitro “é isto”, aquel’outro “é aquilo”… E descobri que não se ficava por aqui. Após um jogo fora, em que provavelmente perdemos, encostou-se a uma parede, comigo e outros a seu lado, à espera que a equipa de arbitragem passasse à sua frente e lançou-lhes um insulto nada agradável de se ouvir e assim que o árbitro parou e olhou para nós, ele virou-se para o lado oposto como se o dislate tivesse soado dali e nada tivesse a ver com ele.

Pois bem, mais tarde, numa partida em casa, o mesmo indivíduo estava sentado na extremidade do banco reservado aos técnicos e suplentes e repetiu a graçola com um insulto grave, “tipo filho de qualquer coisa”, dirigido ao árbitro que apitava o jogo, virando-se rapidamente para o público atrás, quando aquele rodopiou e enfrentou o nosso banco, com uma expressão furiosa. “Definitivamente um profissional neste “métier” dos insultos” – pensei eu. Um minuto depois, discretamente, fiz-lhe um sinal chamando-o para perto de mim e mandei-o sair daquele local reservado, com a recomendação de não mais se sentar connosco. Sempre há cada um!

 – segue-se parte 3 – Uma digressão rocambolesca!

 

 

 

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