Patinagem a motor

O ano era 1965.

O inimaginável sucedeu nos primeiros dias em que deambulava por Johannesburg, procurando estabelecer azimutes que me orientassem nesta cidade, uma autêntica miniatura de Nova York. Na célebre “motor town” da Eloff Str., entrei numa loja que vendia materiais e equipamentos, acompanhado por um familiar, o meu ex-sogro Rui Temudo de Andrade Nogueira. Não sei porquê, mas este apresentou-me ao proprietário como um campeão de hóquei em patins e aí o homem abriu os olhos, como se um anjo tivesse caído do céu. Virou-se imediatamente e foi até ao fundo do armazém, voltando pouco depois com uma caixa que pousou à minha frente e que abriu.

Há anos que mandei vir este brinquedo dos Estados Unidos e a experiência que fiz com ele resultou desastrosa – disse então, com um sorriso estampado no rosto – O senhor é campeão, portanto faça-me o gosto de o testar!

Imaginem… uns patins com botins de senhora, de patinagem artística, e um pequeno motor a gasolina que se coloca nas costas, seguro por um par de correias, tipo mochila. Ao ajudar-me a equipar, o olhar jocoso do dono da loja, não sei se por antecipar algum estouro da minha parte, mexeu comigo e disse-lhe então para encher o tanque da gasolina e dar o puxão à corda, o que fez tal como se accionasse um “fora de bordo” das embarcações. Do motor ruidoso, partiam dois cabos flexíveis, um rotativo que foi acoplado a uma roda traseira e outro a terminar numa pega de mão, semelhante à das motas, com o respectivo acelerador manual. Apertei-o suavemente e o engate verificou-se, fazendo girar a roda e lá fui eu uns metros dentro da loja. Para parar, bastou-me libertar o acelerador, e seria mesmo uma solução largá-lo, se antecipasse uma queda.

Para mostrar ao homem que um campeão não deixa as coisas a meio, saí porta fora para o passeio e deste para a avenida de quatro vias, em plena hora de ponta, cheia de carros, acompanhando-os até darmos com o semáforo vermelho, onde parámos. Os motoristas, com as cabeças de fora das janelas, atiravam piadas e sorriam, apontando para mim como se fosse um extra-terrestre. Pois bem, escondido pelo capacete e a viseira que levava, acelerei, esquivei-me entre as viaturas, subi o passeio e regressei todo lesto, entrando na loja, debaixo dos aplausos do patrão e do pessoal. O meu familiar ria-se, com o espanto provocado por aquele acontecimento inédito. Eu, por meu lado, tive de desembaraçar-me do proprietário que a todo custo procurava vender-me a geringonça. Foi uma experiência interessante, além de ter sido a primeira vez que calcei patins na África do Sul.

Nunca pensei que me estreasse assim, nem nunca mais vi apetrecho semelhante!

E assim foi… de patins a motor

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